terça-feira, 26 de junho de 2012

Maioria das vítimas de violência doméstica volta para os agressores

Paula (nome fictício) procurou ajuda ao fim de 30 anos de maus-tratos. Para o fazer, contou os minutos que esteve fora de casa. Cada segundo de atraso podia significar uma agressão. Por isso, quando saiu da Associação Democrática de Defesa dos Interesses e da Igualdade das Mulheres (ADDIM) deixou o seu número de telefone fixo às técnicas. O objectivo era que lhe ligassem pouco depois para perceberem se estava bem. E estava, porque o marido ainda não tinha acordado.Só na manhã da passada quarta-feira, além de Paula, foram mais duas as mulheres que procuraram a sede da ADDIM, no Porto, para denunciar casos de violência doméstica. «Nas últimas semanas, temos tido muito pedidos de ajuda», conta a presidente, Carla Branco, que acredita que a explicação para este aumento pode estar nas notícias que nos últimos dias contam as histórias de mulheres que morreram às mãos dos seus agressores.
Em duas semanas, foram já cinco os casos de homicídios ou tentativas de homicídio de vítimas de violência doméstica. Os números provisórios da Polícia Judiciária (PJ) mostram que, desde Janeiro até à semana passada, foram dez as mulheres mortas pelos companheiros. E, se olharmos para a contabilidade feita pelo Observatório das Mulheres Assassinadas, em 2011 foram 27 os casos de femicídio (termo técnico para homicídios de mulheres pelos companheiros).
No entanto, fonte oficial da PJ acredita que não há nada que indique um aumento deste fenómeno «em relação ao primeiro semestre do ano passado». E sublinha o facto de as situações serem ainda muito recentes para se tirar uma conclusão. Não se esconde, no entanto, que este é um crime que «causa especial preocupação». A razão está nas estatísticas: cerca de 40% de todos os homicídios registados em Portugal estão relacionados com situações de violência entre cônjuges.
Resposta demasiado lenta
Magda tinha 20 anos e estava grávida de oito meses. Morreu no dia 10 Junho, depois de um ex-namorado a ter atacado com uma catana. Tinha feito várias participações à GNR. A imprensa escreveu que foram 47, mas fonte oficial da polícia explica que esse número não corresponde à realidade. «Houve duas queixas no Bombarral e duas no Cadaval apresentadas pela vítima». A estas juntam-se mais sete feitas por familiares e amigos, mas nem todas ficaram registadas como violência doméstica – algumas foram apresentadas como meras ofensas à integridade física.
De qualquer modo, o Ministério Público (MP) impôs uma proibição de contacto com a vítima e com os seus familiares, estando o agressor proibido de se aproximar até 300 metros de Magda. Além disso, a GNR tinha feito uma busca domiciliária à casa do agressor, onde «não encontrou qualquer arma». «Era uma coisa impossível de impedir. Ela vivia com um militar da GNR e nem isso impediu o crime», comenta fonte daquela polícia.
Joana Marques Vidal, presidente da APAV (Associação de Apoio à Vítima), lembra que o motivo pelo qual o MP nem sempre actua, impondo medidas de afastamento do agressor, está na forma como o crime é registado na queixa. «Se a participação for feita como agressão ou ameaça à integridade física, em vez de violência doméstica, isso faz com que não sejam accionados os mecanismos adequados, como a prisão preventiva». A solução, defende, está «em mais formação e sensibilização de polícias e magistrados».
Carla Branco, da ADDIM, tem outra explicação para o desfecho fatal destas cinco mulheres. «O tempo de resposta é demasiado lento», denuncia, contando que às vezes espera-se «oito meses ou um ano até que a queixa seja comunicada ao MP».
Fonte: http://sol.sapo.pt/inicio/Sociedade/Interior.aspx?content_id=52882

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